Lá vinha o cortejo dos negros,
capitães e capitãs de bastão e espada na mão, atravessando a avenida
Américo Vespúcio e convocando a força e a memória da ancestralidade. A
manifestação de tradição e fé dos congados do bairro Aparecida, em Belo
Horizonte, deram vida ao álbum “Aparecida, Reinos Negros”. Em suas 29
faixas, o disco reúne os reinados “Guarda de Moçambique e Congo Nossa
Senhora do Rosário e Sagrado Coração de Jesus – Irmandade Os Carolinos”,
“Guarda de Congo Feminino Nossa Senhora do Rosário” e a “Guarda de
Moçambique do Divino Espírito Santo do Reino de São Benedito”.
Aproximar o público dessa cultura que
segue marcando a existência afro-mineira na periferia de Belo Horizonte
é a missão destinada a “Aparecida, Reinos Negros”. Além das guardas, o
álbum conta com participações de Chico César, Fabiana Cozza, Mauricio
Tizumba e Pereira da Viola. Sérgio Pererê, que assina a produção musical
e a idealização do trabalho ao lado do produtor Elias Gibran, também
participa de três faixas. O disco foi viabilizado por meio do Edital de
Chamamento Público de Patrocínio a Projetos e Eventos CODEMIG 01/2017.
“Aparecida, Reinos Negros” traz a variedade rítmica das guardas de moçambique e congo,
como marcha-grave, moçambique serra-acima, moçambique serra-abaixo,
dobrado, compassado e parasero, e os instrumentos tradicionais de cada
uma como tambores, gungas, patangomes e sanfona. Os pontos/músicas
interpretados por capitãs, capitães, caixeiros e dançantes foram e são
perpetuados e transmitidos pela tradição oral de cada reinado. Neles,
estão representados o cotidiano de devoção a Nossa Senhora do Rosário,
aos santos negros e aos antepassados, a celebração da festa como marco
maior da vivência da fé e o lamento e a resistência do povo negro
atravessando os tempos.
Aparecida: muito mais que um território
Criado em 1928 sob o nome Vila Maria
Aparecida, o bairro Aparecida compõe o conjunto de bairros operários
que, ainda que localizados próximos ao Centro, sempre estiveram muito à
margem dele. Os três reinados do Aparecida remontam aos reinos negros
que se conformaram no Brasil e que participaram da recriação de
significados, laços familiares e práticas de fé no contexto da
resistência à escravidão. São também reminiscências das tradições do
antigo Curral Del Rey e do repertório religioso-cultural trazido pela
mão de obra vinda do interior para a construção da nova capital.
Reinados
As guardas de congado, em seus
cortejos, reinterpretam nas ruas o mito fundador da aparição e retirada
de Nossa Senhora do Rosário do mar pelos negros escravizados. Durante
todo o ano, as guardas percorrem os diversos festejos de Belo Horizonte e
de cidades vizinhas, em um movimento de visitas mútuas que compõem o
ciclo anual do Rosário. As três guardas do bairro Aparecida são guardiãs
desses saberes. Em 1937, quando Luiz Carolino
refundou a Irmandade Os Carolinos, que Chico Kalu criara em 1917 em
Contagem, a Avenida Américo Vespúcio, a principal do bairro, ainda era
rio. A Irmandade é a terceira mais antiga da
cidade ainda em atividade. Já o Congo Feminino do Aparecida é formado
por filhas e netas dos fundadores da Guarda de Congo de Nossa Senhora do
Rosário (“Guarda dos Caducos”), que existiu no mesmo bairro, de 1940 a
1976, e bateu pela primeira vez em 1973, a despeito da imposição que
tanto ouviam – “Congado não é coisa de mulher”. Desta é que surge a
Guarda de Moçambique do Divino Espírito Santo do Reino de São Benedito,
fundada em 1996. Juntas, mantém viva a tradição dos reinos negros no
bairro operário.
FICHA TÉNICA
O disco foi idealizado por Sérgio
Pererê e Elias Gibran, e todas as etapas de sua concepção e produção
foram construídas de forma colaborativa com integrantes das guardas
participantes. Gravado, mixado e masterizado no Estúdio Casa Antiga por
Fabrício Galvani, em Belo Horizonte -MG, entre abril e junho de 2017,
com exceção das músicas “Chamado” e “Rosário dos Pretos” que foram
gravadas e mixadas por André Cabelo no Estúdio Engenho, e “Tambores”,
gravada por Jeremias Straitjer no Estúdio Chita.
Produção musical: Sérgio Pererê
Se vc gostou adquiri o original valorize a obra do artista.
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