Álbum 'Mar Azul...' reúne releituras contemporâneas do Clube da Esquina
Revelações da nova cena da MPB surpreendem ao revisitar o cancioneiro setentista de Milton Nascimento e sua turma
Quarenta e três anos depois do
lançamento
do álbum seminal do movimento que fez história na MPB, é fato: muita
coisa ainda pulsa no cancioneiro do Clube da Esquina, além das tão
propaladas melodia e harmonia. Prova disso é 'Mar Azul – Sons de Minas
Gerais vol.1', que será disponibilizado nesta segunda na internet.
Distante do desgastado formato coletânea, o projeto audiovisual traz
interpretações contemporâneas para 10 clássicos de Milton Nascimento e
cia., com direito a recriações dignas das canções originais.
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Aos clássicos, foi acrescentada uma pérola recente da parceria dos irmãos Márcio e Lô Borges, 'Quem sabe isso
quer
dizer amor'. O tributo privilegia os álbuns 'Clube da Esquina' (1972) e
'Clube da Esquina 2' (1978), mas não se limita a eles. Originalmente
pensado como um documentário, o projeto acabou resultando em 11 vídeos
que poderão ser conferidos
.Os áudios estarão reunidos em um álbum disponibilizado com
exclusividade
na web pelo selo Slap, da gravadora Som Livre. Fiel ao conceito
audiovisual, cada vídeofaixa de 'Mar Azul...' é antecedida por pequeno
depoimento do intérprete, justificando a escolha daquela canção. O
segundo volume do projeto não é descartado pelos produtores, conforme
sugere o próprio subtítulo. A única faixa em versão instrumental é
'Nascente', de Flávio Venturini e Murilo Antunes.
Aos veteranos Pedro Luís e
Moska, se juntaram os novatos César Lacerda, Júlia Vargas, Silva, Maíra
Freitas, Michele Leal, Lucas Arruda, Dani Black e João Bittencourt, além
do grupo vocal Ordinarius. A ideia partiu de Fernando Neumayer e Luís
Martino, sócios da produtora carioca Tocavideos. A dupla dirigiu os
vídeos, quase todos filmados no Bituca Estúdio – com exceção de 'Reis e
rainhas do maracatu', com Pedro Luís, rodado no Godofredo Bar, em
Botafogo, que pertence a Gabriel Guedes, filho do compositor Beto
Guedes.
Aliás, a ideia inicial era dar ao projeto o título 'Tudo
que move', a partir do verso de 'Amor de índio', de Beto Guedes e
Ronaldo Bastos. Essa canção acabou não entrando no repertório.
“Lendo sobre o movimento, acabei chegando àquela
casa
em Mar Azul, praia de Niterói onde os integrantes do Clube da Esquina
passaram uma temporada antes da gravar o primeiro disco”, diz Fernando
Neumayer, ao justificar o batismo definitivo do projeto.
Muito
ligado ao meio audiovisual e à tecnologia, foi assim que ele chegou ao
formato inovador de 'Mar Azul...' – que, em boa hora, une música e
vídeo. “Talvez o projeto não surgisse há alguns anos”, admite,
atribuindo a opção, que remete ao documentário, aos tempos atuais, em
que o disco físico está praticamente extinto.
A informalidade do
movimento mineiro, que reunia músicos e profissionais de meios variados,
como o fotógrafo Cafi, é um dos aspectos que mais chamaram a atenção do
produtor de 'Mar Azul...'. “Aquela coisa de muita gente no estúdio, da
macarronada na casa dos Borges”, diz Neumayer. Ele se refere à
residência da família de Lô e Márcio, perto da esquina das ruas
Paraisópolis e Divinópolis, no bairro belo-horizontino de Santa Tereza,
de onde veio o nome do clube.
Na hora da escolha da faixa a ser
gravada por cada artista, pesou a questão pessoal. “É um samba de
maracatu, uma marca forte da nobreza da negritude”, afirma o cantor e
compositor Pedro Luís a respeito de 'Reis e rainhas do maracatu', que
ele interpreta ao violão. O carioca revela que o primeiro 'Clube da
Esquina' chamou a sua atenção “pelo som gringo, no bom sentido”. “É bem
gravado e bem mixado, o que faz você querer ouvir cada vez mais”,
explica. Pedro conta que seus LPs 'Minas', de Milton, e 'Falso
brilhante', de Elis Regina, chegaram a furar de tanto serem ouvidos.
A
cantora e pianista Maíra Freitas, filha de Martinho da Vila, confessa:
foi difícil escolher uma entre tantas canções do movimento musical
mineiro que conquistou o mundo. Ela optou por 'Cravo e canela', que diz
adorar por ser “muito percussiva e dançante”. Impressiona a releitura
conferida pela carioca a esse clássico, já gravado por tantos artistas.
Por
sua vez, Júlia Vargas, que optou por 'Canoa, canoa', confessa que
sempre quis cantá-la. “De certa forma, a canção me transporta para a
terra em que nasci, Cabo Frio”, diz a jovem intérprete, dona de timbre e
presença cênica possantes. “É uma ‘responsa’ cantar uma música dessas”,
admite Júlia, contando que escolheu o mesmo tom de Milton Nascimento.
Não por acaso, Bituca apadrinhou a moça – tem feito shows com Júlia pelo
país e a convidou para dividir o palco com ele e o rapper Criolo, em
2014.
César Lacerda optou por 'Pedras rolando', classificada por
ele como “a fruição mais celestial de uma coisa muito maravilhosa”.
Diamantinense radicado no Rio de Janeiro, o jovem músico se empolga:
“Beto Guedes é uma pedra filosofal misteriosa. Aquela voz, aquelas
letras, aquela harmonia”.
Se, por um lado, muitos optaram por
gravar em companhia do próprio instrumento, outros convidaram músicos
para acompanhá-los. Michele Leal, nascida em Itajubá, canta 'Paisagem da
janela' ao lado do pianista Francisco Pellegrini. A intimidade com essa
canção veio da época em que, criança, integrava corais da cidade do Sul
de Minas. Júlia Vargas convidou o flautista Fábio Luna e o violonista
Rodrigo Garcia para gravar 'Canoa, canoa' com ela.
Criadores do Clube aprovam Mar Azul
Surpreendidos
com o lançamento de 'Mar Azul – Sons de Minas Gerais vol. 1',
integrantes do Clube da Esquina chegaram a se emocionar com o projeto
dedicado à obra de Milton Nascimento e seus parceiros.
“Estou
maravilhado. Tudo cresceu no espaço e no tempo muito além de minhas
expectativas. Sinceramente, não estava sabendo de mais essa iniciativa,
que me emociona bastante. É um bom sinal pra gente saber que, em 43
anos de trabalho, deixou algo tanto para a nossa própria geração quanto
para as novas gerações, que estão antenadas à nossa própria história”,
afirma o compositor Márcio Borges, um dos principais letristas do
Clube da Esquina, ao lado de Fernando Brant e Ronaldo Bastos.
De
Cannes, na França, onde participa do Midem, o maior encontro mundial
de empresas ligadas à música, Ronaldo Bastos desejou sucesso ao
empreendimento, enquanto Borges acredita que 'Mar Azul...' tem tudo a
ver com as novas propostas do mercado fonográfico.
“A indústria
fonográfica deu muitos passos errados, ao contrário da TV, que investe
em conteúdo”, repara Borges. “Primeiro, ela investiu no público jovem
sem potencial de consumo. Depois, achou que o público era imbecil,
simplificando ao máximo os conteúdos”, acrescenta.
WEB Márcio
diz que a febre atual do vinil é uma das provas do equívoco da
indústria em substituí-lo pelo CD. “O vinil tem uma reprodução muito
melhor”, afirma, saudando as novidades. “É bacana que projetos como 'Mar
Azul...' consigam envolver a música com a tecnologia, a web. Vejo isso
como solução para a crise que estamos vivendo no mercado”, conclui o
parceiro de Milton Nascimento e Lô Borges nas canções 'Clube da Esquina'
e 'Clube da Esquina 2'.
Ailton Magioli - EM Cultura
Publicação:
08/06/2015
1. Pedras rolando (Beto Guedes e Ronaldo Bastos, 1979) - César Lacerda
2. Canoa, canoa (Nelson Ângelo e Fernando Brant, 1977) - Júlia Vargas
3. Um girassol da cor de seu cabelo (Márcio Borges e Lô Borges, 1972) - Silva
4. Reis e rainhas do maracatu (Nelson Ângelo, Novelli e Fran, 1977) - Pedro Luís
5. Cravo e canela (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1971) - Maíra Freitas
6. Paisagem da janela (Lô Borges e Fernando Brant, 1972) - Michele Leal
7. Nada será como antes (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1972) - Ordinarius
8. Fazenda (Nelson Ângelo, 1976) - Lucas Arruda
9. Travessia (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1967) - Dani Black
10. Quem sabe isso quer dizer amor (Márcio Borges e Lô Borges, 2002) - Moska
11. Nascente (Flávio Venturini e Murilo Antunes, 1977) - João Bittencourt
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